Terça-feira, 23 de agosto de 2011
Última Modificação: // | Visualizada 1947 vezes
EDUCAÇÃO E CAMPO
Ouvir matéria
O Seminário de Educação no Campo, realizado nos dias 18 e 19, promoveu um importante debate para a região dos campos gerais. O evento foi organizado pelo Curso de Agroecologia do IFPR – Núcleo Avançado de Ortigueira, em parceria com a Casa Familiar, Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Via Campesina e Prefeitura Municipal.
Cerca de 150 pessoas estiveram presentes no encontro,
que promoveu a articulação e a troca de experiências entre profissionais e
movimentos sociais ligados à educação e ao campo. Uma peça de teatro realizada sobre a valorização da educação no campo abriu o evento.
Participaram educadores, gestores municipais, representantes da Secretaria de Estado da Educação (SEED), do Ministério da Educação (MEC), do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), além do reitor do IFPR, Irineu Mário Colombo, do prefeito de Ortigueira, Geraldo Magela e professores do curso de Agroecologia dos campus de Ivaiporã, Umuarama, Assis Chateaubriand, Irati e do Núcleo Avançado de Ortigueira.
Articulação Regional pela Educação do Campo
Durante o seminário foi anunciada a criação da Articulação Regional pela Educação do Campo no Território Caminhos do Tibagi. O anúncio foi feito por meio da Carta de Ortigueira pela Educação no Campo, durante o Seminário.
Segundo o professor Roberto Martins, do IFPR, a educação no campo deve partir das experiências que já existem para que novas políticas possam ser instituídas. “Precisamos envolver educadores, alunos, instituições públicas, onde estão os gestores de educação municipais estaduais e federais, para atingir resultados concretos”.
Os Índices de Desenvolvimento Humano do município e níveis de analfabetismo da região são levados em consideração para um novo caminho para o campo. “Temos um dos piores índices de analfabetismo funcional do estado. Precisamos de uma solução prática já que entre os agricultores, é onde esse nível de analfabetismo se encontra mais elevado. Temos que problematizar e trabalhar com a realidade social do campo”, explica.
Segundo o professor, o IFPR tem interesse em fazer com que as experiências do campo ganhem um destaque especial no instituto. Para ele, tanto a comunidade, como as escolas municipais e gestores de políticas públicas devem se mobilizar.
“Os dados apontam que 60% da população moram na zona rural e que as piores condições de escolarização encontram-se lá. Hoje a escola está voltada para a cidade, temos que voltá-la para os povos do campo que são quilombolas, indígenas, agricultores familiares, ribeirinhos e outros, que têm uma configuração étnico-racial diferenciada. O campo necessita de uma escola que consiga penetrar em sua realidade e gerar o desenvolvimento na comunidade”, enfatiza Martins.
Valorização do campo
Para o prefeito de Ortigueira, Geraldo Magela, a discussão sobre educação no campo não é importante somente para Ortigueira. “Essa é uma preocupação global. Cada um de nós tem responsabilidade e temos que valorizar a região do campo. Se continuarmos deixando que as pessoas saiam do campo por falta de incentivo, estamos caminhando para uma situação insustentável no futuro. A cidade depende do campo”.
De acordo com Magela, a valorização do campo estimulada hoje pelo IFPR é o caminho para a região dos Campos Gerais. “Mesmo que o jovem saia do campo e vá para a cidade, ele deve ter a consciência plena do que é o campo. Precisamos dar ao homem do campo a mesma condição que damos ao homem da cidade, e isso pode acontecer por meio da educação”.
Hoje o município de Ortigueira incentiva o estudo da população que reside no campo fornecendo transporte escolar gratuito para diversas cidades. “Temos hoje mais de 220 linhas e 98 veículos para o transporte, dos quais 20 são do município. Só não estuda quem não quer, mas ainda assim queremos melhorar a educação no campo”.
Movimentos e comunidades
Segundo o professor Antenor Lima, da Contag – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Agricultura, os movimentos sociais e as mulheres do campo merecem o reconhecimento da sociedade pelas mudanças que vêm sendo feitas na educação rural.
“Foram elas, as mulheres dos movimentos sociais, as mulheres do campo que disseram que já era hora de discutirmos de gato o problema da educação no campo, a educação dos filhos delas. Elas nos lembram que se queremos fazer uma mudança na sociedade, que seja primeiro na educação. São essas muitas das 70 mil mulheres que marcharam em Brasília, no dia 17, fazendo várias reivindicações, sendo uma delas a educação no campo”.
Ampliação do ensino superior e tecnológico
Segundo o representante do MDA – Ministério do Desenvolvimento Agrário, Reni Denardi, a educação no campo recebe agora um incentivo a mais. “A ampliação do ensino está fortemente articulada com a estratégia do governo federal de combater a pobreza no campo. É um compromisso com a democratização e descentralização da educação. Ortigueira é, de acordo com os dados censitários, o segundo município do Paraná com o maior número de agricultores familiares. A agricultura familiar é sinônimo de progresso e desenvolvimento, por isso o MDA investe no campo”.
Para Denardi, o desafio de promover o desenvolvimento não virá de uma atuação municipal, estadual ou federal, mas sim da articulação de forças. “Um agricultor hoje não pode ser analfabeto, por isso é importante levar até eles a educação. Ninguém quer ‘fixar’ o homem no campo, mas a pessoa tem que ter a oportunidade de ir pra onde ela quer e ter a opção de ficar no campo se essa for a vontade dela”.
Para Denardi, o homem do campo já sabe de sua importância para o país. “A maior parte dos agricultores anda de cabeça erguida, não tem vergonha de fazer suas manifestações, reivindicações, de dialogar com o governo e de se apresentar pra sociedade”, considera.
Os investimentos do Ministério da Educação para o campo também são significativos. Segundo Eduardo Goes de Oliveira, do MEC, a primeira ação é atender as demandas. “Nós respeitamos o papel do município e precisamos trazer uma política pública nacional, mas que atenda à identidade local. São direitos historicamente negados e populações historicamente excluídas, por isso pretendemos incentivar cada vez mais a construção dessa política”.
Mobilização
Segundo o reitor do IFPR, Irineu Mário Colombo, o que realmente é válido da discussão da educação no campo são os resultados práticos, que englobam o aspecto social e o desenvolvimento.
“Temos no campo a dificuldade do conforto, que não é o mesmo da cidade. Não adianta fazer uma educação desvinculada. O aspecto cultural deve ser respeitado, seja pelas origens, seja pelas metodologias de ensino. As instituições devem se unir em prol desse respeito e investir tanto em tecnologia como em cultura”.
Para o reitor, o combate à pobreza no campo está ligado diretamente ao investimento em educação e tecnologia. O IFPR, que terá uma expansão, com mais sete unidades, investe hoje tanto em ensino, extensão e pesquisa.
O conhecimento da realidade do campo e o acesso aos processos tecnológicos oferecem, segundo o reitor, o conforto maior para que o jovem possa continuar a vida no campo “Podemos criar aqui em Ortigueira uma unidade descentralizada e trabalhar com os jovens num processo de sensibilização. O jovem do campo tem que entender como funciona o sistema financeiro, quais os programas voltados ao financiamento rural, como ele acessa esses programas e como faz a gestão. Isso tudo também faz parte do educação, para que ele possa se viabilizar economicamente e entender o mecanismo externo de sua propriedade rural. Temos o desafio da sustentabilidade e quanto mais ele produzir com qualidade e também terá maior qualidade de vida”.
Fonte: Fernanda Rodrigues